terça-feira, 22 de setembro de 2009

Hai Cai do Cachoeira (Brisa Aziz)



o manzuá no rio
enjaula camarões
trama de pescador

terça-feira, 21 de julho de 2009

Antes do Nome (Adélia Prado)

Não me importa a palavra , esta corriqueira.
Quero é o esplêndido caos de onde emerge a sintaxe,
os sítios escuros onde nasce o "de", o "aliás",
o "o", o "porém" e o "que", esta incompreensível
muleta que me apoia.
Quem entender a linguagem entende Deus
cujo Filho é Verbo. Morre quem entender.
A palvra é disfarce de uma coisa mais grave, surda-muda,
foi inventada para ser calada.
Em momentos de graça, infrequentíssimos,
se poderá apanhá-la: um peixe vivo com a mão.
Puro susto e terror.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Dança das Sombras (de Daniela Galdino)

"Vai-se a primeira pomba..."
e as demais...
Como ficaria extasiado
se no céu somente pombas pairassem!

Agora os anjos esperam
- soturnamente -
mais uma alma pueril.

Vai-se o primeiro garoto:
Lábios secos, olhos fundos
Mais osso do que pele.

Sobe nesse instante
uma menina
que há muito não via
as asas alvas de uma pomba.
Somente a orquestra dos urubus
bicando o seu futuro.

Seu sorriso sem dentes,
Seu pulmão tubérculo,
Sua grande agonia,
São indícios de um tempo
Em que a esperança
É um ultraje ao pudor.

domingo, 24 de maio de 2009

Espera (Firmino Rocha)

Não acordar a palavra
Deixar que ela sinta no silêncio
os frêmitos de todos os mistérios
até o último instante.
Nova e virgem então ela virá
e ao poema dará seiva e fervor.
Não acordar a palavra
Deixar que ela durma no silêncio
o seu fecundo sono
até que como o sol desperte
e descubra as coisas
e nada deixe em escuridão e frio.
O poema então será verdade,
amor e carinho.

PS: gente, que delícia esse poema... cheiro de orvalho no ar... tive que postar e dividir com vocÊs rsrs
Firmino Rocha foi um poeta daqui da cidade onde moro agora - Itabuna, na Bahia. O cara é tão aclamado aqui na região que o Festival Multiarte que a Prefeitura promove todo ano leva o nome dele. Quem ganha (tem várias categorias: música, dança, teatro, cordel) leva um troféu Firmino Rocha pra casa :) ói só, que luxo... rsrs

quinta-feira, 19 de março de 2009

Autopsicografia (Fernando Pessoa)

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que lêem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as duas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.
E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

sábado, 14 de março de 2009

Não há Vagas (Ferreira Gullar)

O preço do feijão
não cabe no poema.
O preço
do arroz
não cabe no poema.
Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação
do leite
da carne
do açúcar
do pão.

O funcionário público
não cabe no poema
com seu salário de fome
sua vida fechada
em arquivos.
Como não cabe no poema
o operário
que esmerila seu dia de aço
e carvão
nas oficinas escuras

– porque o poema, senhores,
está fechado: “não há vagas”
Só cabe no poema
o homem sem estômago
a mulher de nuvens
a fruta sem preço

O poema, senhores,
não fede
nem cheira.

quinta-feira, 22 de janeiro de 2009

Corridinho ( Adélia Prado)

O amor quer abraçar e não pode.

A multidão em volta,

com seus olhos cediços,

põe caco de vidro no muro

para o amor desistir.

O amor usa o correio,

o correio trapaceia,

a carta não chega,

o amor fica sem saber se é ou não é.

O amor pega o cavalo,

desembarca do trem,

chega na porta cansado

de tanto caminhar a pé.

Fala a palavra açucena,

pede água, bebe café,

dorme na sua presença,

chupa bala de hortelã.

Tudo manha, truque, engenho:

é descuidar, o amor te pega,

te come, te molha todo.

Mas água o amor não é.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

ó paí ó

bastou eu falar em dengue para experimentar, pessoalmente, do que se trata...